Uma coisa é certa: a melhor forma
de educar filhos muda com espantosa velocidade. Os tempos também são outros. Para sair
deste imbróglio é preciso atualizar-se.
Ler com uma visão crítica tudo o que aparece. Para dar minha contribuição a
isto, segue um texto que li e achei pertinente.
Falta de limite para a
criança e os determinantes de um crescimento feliz.
|
por Ceres Araujo
|
Foco aqui um trajeto de desenvolvimento infeliz, que está sendo frequente
nos nossos dias.
Cumpre salientar que existem trajetos felizes de desenvolvimento. Existem famílias
funcionais, onde os filhos crescem sob o olhar coruja de seus pais, filhos que
se sentem amados, valorizados, mas recebem os limites adequados ao seu
comportamento e aprendem a viver civilizadamente na coletividade, respeitando
os outros e se fazendo ser respeitados.
Entretanto, existem aqueles filhos que foram criados de forma superprotegida.
A Psicologia e a Pedagogia do meio do século anterior, talvez tenham sido as
principais responsáveis pela retirada das interdições às condutas das crianças.
Postulava-se que uma educação restritiva demais impediria o desabrochar das
potencialidades da criança. Isso pode ser mesmo verdade, porém, da tese se
partiu para a antítese. O “não” foi abolido como execrável, passando a ser
proibido. As crianças ganharam o mando nas famílias e os pais se submeteram a
elas, possivelmente acreditando que assim iriam formar pessoas com
“personalidade forte” e criativas.
Ledo engano, a história provou o contrário. Crianças que foram criadas sem
limites, não adquiriram o controle necessário sobre seus impulsos, não
aprenderam a entreter tensão interna, a tolerar esperas e não foram ensinadas a
lidar com frustração. Como resultante, crianças criadas dessa forma tiveram
prejuízos na capacidade para elaboração mental e prejuízos também no
fortalecimento do ego. Não atualizaram portanto seus potenciais para o
desenvolvimento, ao contrário, os desperdiçaram.
As crianças que viveram sem os “nãos”, buscaram sempre o prazer imediato e se
acostumaram a exigir a satisfação pronta de suas necessidades e desejos. Não
aprenderam a levar as necessidades e desejos do outro em consideração, pois,
centradas em si mesmas e egoístas, tornaram seus pais reféns de suas
exigências. Assim os pais, modelos primários de identidade, foram desvalorizados
e despontencializados. Elas se acreditaram superpoderosas e donas do mundo.
Assustadoras, por sua postura arrogante e agressiva, internamente se
constituíram como fracas e assustadiças, pois não tinham quem as protegessem
até delas mesmas.
Esses filhos cresceram desperdiçando suas energias para manter a ilusão de sua
onipotência. Usaram de birra, negativismo e oposição na crença de que poderiam
manter suas famílias e seus professores sob seu jugo. Alguns tiveram a
felicidade de encontrar pessoas psicologicamente mais fortes e íntegras que os
confrontaram, os ajudaram a sair dessa situação de “bebês eternos” e os
ensinaram a considerar as pessoas e a fazer trocas afetivas e de conhecimento
com elas. Outros, entretanto, cresceram como centro de atenções patológicas dos
pais, jamais contrariados e se transformaram em adolescentes difíceis de trato,
cheios da presunção de serem únicos, sempre exigentes e insatisfeitos.
Com constante dificuldade para lidar com frustração e para controlar seus
impulsos, esses adolescentes se transformaram em adultos pouco criativos, com
problemas na conduta interativa e na conduta social. Consequentemente, tenderam
a falhar nas atividades profissionais. Mudanças de emprego, de trabalho
frequentes demais caracterizam essas pessoas, pois elas não adquiriram a
possibilidade de aceitar comandos e não sabem usar inteligentemente de
argumentações e negociações.
São adultos também incapacitados para relacionamentos interpessoais que sejam
nutridores, por não terem sido preparados para assumir qualquer
responsabilidade sobre o outro. Querem apenas receber e pouco sabem dar alguma
coisa em troca.
Existe uma corrente que ainda acredita que o adulto criado dessa maneira pode
dar certo no trabalho e que talvez essa seja a fórmula para o indivíduo ser um
empreendedor de sucesso. Será? Provavelmente não, pois não se vive no mundo das
ideias, mas no mundo de pessoas.
Empreender algo pode se iniciar como ação individual, mas é uma ação que
precisa ser posta em prática no mundo das pessoas e das situações, requerendo
uma série de competências que indivíduos que foram criados sem limites
dificilmente terão. Lembro aqui algumas delas: liderança, trabalho em equipe,
negociação.
Quais seriam os determinantes então de um crescimento feliz?
É difícil responder a essa questão. Não existem fórmulas precisas, apenas
indicadores para um desenvolvimento saudável. Cada criança nasce dotada de uma
carga genética que interage com o meio no qual ela se insere. O cérebro se
estrutura e se desenvolve em função das relações interpessoais da pessoa desde
o início de sua vida. Sabe-se que as redes neuronais se formam em função das
redes de significado a partir das relações da criança com as pessoas que lhe
são importantes.
Para se tornar um ser civilizado, a criança precisa aprender a controlar sua
impulsividade e a regular suas emoções. Necessita de regras, normas, valores e
princípios que possam nortear sua conduta. Decorre daí a importância dos pais
como educadores de verdade. Pais mandam e filhos obedecem – é um saber popular
que faz sentido. Na adolescência, pais mandam e filhos argumentam, pois ganham
o direito a réplicas e tréplicas e, assim, aprendem o poder e o valor de uma
negociação válida, aprendizado que eles mantêm para o resto de suas vidas.
Filhos podem e devem ser mimados. Mimo nunca estragou ninguém, pelo contrário
constitui um fator fundamental para a constituição da autoestima, por garantir
a sensação de ser amado. Mas, os mimos precisam ser associados aos limites, às
interdições e às demandas, proporcionais às diferentes idades.
É função dos pais criarem pessoas que respeitem os outros e que se façam ser
respeitadas, condições básicas para relações afetivas felizes e para êxito
profissional na vida adulta.